Acústica em Home Office - Novos desafios



Acústica em Home Office - Novos desafios
Fig. 01 Pleno com tubulações e eletrodutos transpassando a vedação vertical


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Recentemente, duas matérias me chamaram a atenção sobre o tema da Acústica em Home Office.

A primeira dizia: “Homem é proibido por juiz de fazer barulho durante Home Office” da CNN Business, que fala sobre um litígio entre vizinhos, publicado no dia 02/06/2021, às 20:57h, atualizado às 21:02 por Tatiana Paiva.


A outra matéria era do site Exame.com/carreira e falava sobre o desejo da população em não voltar a trabalhar nos escritórios. “Funcionários pedem demissão para não desistir de home office’’, publicada no dia 02/06/2021, às 10:40hs.


Com o advento da pandemia e a consequência do isolamento social, gerou-se uma tendência do uso cada vez maior de espaços remotos para trabalhar. Este fato levou as pessoas, em um primeiro momento, à adaptação de seu ambiente residencial, que na maioria das vezes não estava preparado para o ruído de atividades potencialmente geradoras de incômodos, como ruídos de trânsito, dos vizinhos e da própria família no cômodo geminado, ocasionando conflitos e litígios jurídicos. 


Essa situação, quando analisada de forma mais ampla, segundo o especialista jurídico Waldir de Arruda Miranda Carneiro, em seu livro ‘’Perturbações sonoras nas edificações urbanas’’ (2002), mostra que existem três pontos principais a considerar: o mau uso da propriedade, as patologias de projetos e os defeitos decorrentes da construção, deixando em segundo plano aspectos como desempenho das edificações, principalmente nestes dois últimos aspectos. 


Pode-se observar que no fato relatado na matéria da CNN Business, relativo ao conflito entre vizinhos que, para trabalhar em casa, a reclamante precisou entrar na justiça, com ganho de causa concedido pelo Juiz  Vinicius Caparelli, do juizado Especial de Birigui (SP), dando ganho de causa amparado na ‘’proteção ao trabalho e ao sossegado”


Em seguida, com o avanço da vacinação e a pressão de alguns empresários na retomada do trabalho presencial, está ocorrendo um conflito com aqueles que consideram o trabalho remoto o novo padrão. 


As pessoas começaram a perceber que é interessante ter a flexibilidade de se trabalhar em casa, diminuindo custos com deslocamentos no trânsito. Outras pessoas têm medo também de novas cepas do vírus no antigo ambiente de trabalho. Mesmo com o desafio do desempenho acústico, muitos estão optando pelo trabalho remoto. Segundo a Kastle Systems, nos EUA, apenas 28% dos trabalhadores retornaram aos escritórios. 


Considerando que a ABTN NBR 15575/13 foi chancelada há mais de 8 anos, nas questões relativas à acústica foram considerados parâmetros com aspectos de desempenho de materiais, com três índices acústicos: o superior, o intermediário e o mínimo.


Podemos então questionar o porquê de tanto litígio jurídico entre vizinhos em unidade habitacional, multidisciplinar.


Com a criação da norma técnica ABNT 15575, em julho de 2013, iniciou-se o processo de despertar e alavancar o mercado da Acústica, sinalizando os investidores e construtoras a adotarem soluções acústicas com melhor desempenho em seus empreendimentos.


Embora com vários parâmetros de desempenho acústico, em relação às vedações verticais, laje e invólucro de fachada, a forma como está sendo executada a edificação com índice mínimo para minimizar custos de construção não garantem  que o vizinho  não se incomode com a transmissão sonora.


Em  comparação com outros países, o desempenho acústico de impacto  da nossa Norma  de desempenho está bem aquém, Fig. 2. 


Tabela

Descrição gerada automaticamente

 Fig. 2 - Tabela comparativa de desempenho de transmissão de impacto entre países, Pró Acústica, 2013.


Inclusive, estará em votação, no dia 29/06/2021, com reunião da ABNTCB-02, a ementa para atualização da NBR 15575/21.


Aqui no Brasil temos um longo caminho a trilhar e vários desafios e interesses de corporações a adequar.


Em um mesmo apartamento, quando um vizinho de cima arrasta um móvel, bate uma porta, se desloca com salto ou com uma pisada mais forte, unhas de cachorro em laje nervurada, maciça, alveolar ou outro tipo de laje, sem estar desacoplada com elastômero (laje flutuante), ocorre uma transmissão de ruído de impacto.  


Hoje a norma ABNT 15575/13 permite passagem de 80dB de transmissão sonora entre unidades habitacionais, situação desfavorável para o usuário do apartamento à baixa que recebe este som perturbador.


Esse ruído é transmitido por vibração estrutural de baixa frequência, propagado diretamente pela laje, pilares, vigas e pelos flancos através das vedações verticais e varia de acordo com a tipologia, dimensão da laje e tempo de reverberação do ambiente receptor. 


Diagrama

Descrição gerada automaticamente



Considerando que cada usuário ou morador tem horários e hábitos distintos, na maioria das vezes há conflitos devido ao ruído. A questão do ruído de impacto é um desafio que só é resolvido plenamente no momento da definição dos projetos arquitetônicos, projeto acústico e do cálculo estrutural, pois para solucionar o problema, quando se trata de uma laje flutuante, é necessário um acréscimo de carga por m² em soluções com elastômeros e contrapiso armado.


Quanto a NBR 15575/13, em relação à acústica entre recintos em habitações distintas no mesmo edifício, um apartamento que contém paredes geminadas e um dos ambientes é um dormitório, o desempenho mínimo solicitado é de 45 dB(A)


Esse valor mínimo é relativo ao sistema e não apenas à vedação vertical geminada. Por exemplo: coloca-se a vedação vertical com desempenho de 45dB, mas esquecem que a porta semi-oca com frestas em toda periferia, ligada ao um hall com materiais reverberantes comuns aos dois apartamentos, vai diminuir o desempenho do sistema, chegando a valores  próximos de  22dB  em  alguns casos.


Logo, o sistema tem desempenho abaixo do recomendado por norma técnica (erro muito comum entre profissionais da Construção Civil). 


Considerando que, em laboratório, o Rw  de uma alvenaria comum tem


  • bloco cerâmico de terracota 6 furos de 140mm com acabamento em chapisco

  • emboço e reboco

  • fundo preparador

  • demão de massa PVA  

  • duas demãos de tinta látex ou acrílica

  • alvenaria final com densidade 165kg/m2; 

e um desempenho de apenas 40dB(A), sem considerar perfurações por passagens de eletrodutos elétricos, tomadas e tubulações hidrossanitárias.

Ainda observamos situações onde  projetos arquitetônicos contemplam especificação de vedações em bloco de gesso de 80mm, acoplado direto na laje de piso e coberta, com desempenho que não chega a 33dB(A). Isso acarreta transmissão de ruído aéreo entre recintos, eliminando a privacidade e causando incômodo, mal-estar e litígio jurídico entre as partes. 


Hoje é comum, infelizmente, a “não conformidade” em muitos projetos arquitetônicos e obras relativas ao ruído aéreo,  às partições verticais, ao ruído de impacto da laje, de coberta, do invólucro de fachada, de máquinas, de geradores, de elevadores, de bombas e de edícula de gás GLP, salões de festas e academias das unidades multidisciplinares existentes nas edificações. 


Sem falar no ruído de retrossifonagem relativo à descarga com colunas hidrossanitárias embutidas em shaft (também conhecido como duto), que ligam todos os andares no ruído de piscinas em coberturas, de vibração e o aéreo de helipontos.


Por isso, mais uma vez, a importância de se trabalhar a experiência do cliente final no nascer do projeto arquitetônico, compatibilizado ao projeto acústico e aos seus projetos complementares. Desta forma, permite-se a mitigação de futuras patologias e, consequentemente, um menor retrabalho na obra, diminuição de custos de correções e custos jurídicos com o cliente final, prevalecendo um projeto arquitetônico que contemple não só a aparência, mas também a experiência agradável da atividade  desempenhada pelo usuário.


De fato, não são todos os profissionais que podem trabalhar remotamente, ou em suas residências. Entretanto, para aqueles que desejam ter os benefícios do trabalho remoto e ajudar seus clientes a melhorar o desempenho dos ambientes, a qualificação acústica é necessária.


Por isso, o Curso EAD do INBEC sobre Acústica em Home Office permite que profissionais da Construção Civil, como engenheiros, arquitetos, designers e técnicos em informações técnicas corrijam espaços construídos, projetem novos ambientes e mitiguem desafios acústicos.



 Especialista em Acústica Arquitetônica e Iluminação, Graduado em Arquitetura e Urbanismo pela Faculdade de Ciências Humanas ESUDA. Atualmente é Arquiteto e Urbanista da - Ar Racif Construções, elaborando e executando projetos acústicos arquitetônicos. Professor de Pós-Graduação em acústica na Faculdade ESUDA/PE.