Colapso da
represa de minério de ferro de Brumadinho, Janeiro de 2019. Imagem via Daily
Overview. Image © Maxar Technologies – Westminster, Colorado -
ArchDaily/Reprodução
As
temporadas de verão no hemisfério sul, principalmente na região entre os
trópicos e a linha do Equador são marcadas por alta umidade, fortes chuvas e
alta temperatura. Junto das tempestades de verão, o Brasil também lida com uma
série de eventos violentos como enchentes,
desbarrancamentos e rupturas de barragens.
Ao longo dos
anos, tem sido cada vez mais comum a concentração desses eventos durante os
meses de novembro a março e seu
acontecimento está diretamente relacionado às chuvas de verão, mas também às
atividades econômicas em curso no Brasil.
Recentemente,
o estado de Minas Gerais, região sudeste brasileira, tem enfrentado diversos acidentes naturais devido às
fortes chuvas. Até o dia 13 de janeiro deste ano, o estado contava com 374
cidades em situação de emergência, 26,4
mil desalojados e mais de 20 fatalidades.
Um dos
grandes desabamentos afetou a cidade de Ouro
Preto, considerada Patrimônio Mundial pela Unesco desde 1980 devido à sua história e arquitetura colonial. O
desabamento de terra ocorreu no perímetro urbano da cidade e destruiu
construções coloniais do século XIX e colocou ainda outras em risco.
Ouro Preto,
Minas Gerais. Image © Rosino, Flickr. Licença CC BY-SA 2.0 - ArchDaily/Reprodução
O estado
também já foi local de desastres ainda maiores, quando em 2015 em Mariana e 2019 em Brumadinho as barragens de rejeitos do Fundão (Samarco) e do Córrego
do Feijão (Vale S.A) romperam e destruíram cidades inteiras, deixando mais de 250 mortes registradas e um
rastro de destruição ambiental, cultural e social. Esses desastres estão longe
de serem “acidentes”. São resultado de décadas de uma das atividades econômicas
mais importantes do PIB nacional: a
extração de minério.
Bento
Rodrigues, Mariana - MG, após rompimento da barragem. Image © Brasil de Fato on
Visualhunt - ArchDaily/Reprodução
A mineração
representou 4% do PIB brasileiro em
2020, na ordem dos mais de R$200 bilhões de reais. Essa atividade econômica
dialoga com a economia extrativista que herdamos do Brasil Colônia, desde a
extração do pau Brasil. O extrativismo e a dependência das commodities é uma
característica da economia brasileira e impacta de diferentes modos o
território nacional e sua população.
Ao mesmo
tempo, a mineração é uma das principais atividades comerciais do Brasil
atualmente e consiste em manipular o meio natural para extrair matéria-prima a
ser transformada na produção de diversos tipos de produtos, já que os minerais
estão presentes em praticamente tudo
aquilo que consumimos.
Mineração
Congonhas MG 28/09. Image © midianinja on VisualHun - ArchDaily/Reprodução
Muitas vezes
o minério precisa passar por processos transformadores e preparatórios para sua
comercialização, os quais geram resíduos
e rejeitos que em geral não têm utilidade e precisam ser descartados, como
é o caso dos rejeitos da mineração do ferro, que já foram depositados em rios e
hoje em dia são concentrados em barragens, como aquelas que se romperam em
Brumadinho e Mariana. Independentemente do método, a extração mineral é danosa
ao meio ambiente principalmente quando feita sem controle.
© Carl
Campbell on Visualhunt -
ArchDaily/Reprodução
E o que a arquitetura tem a ver com
isso?
A construção civil conforme praticada
hoje é uma das principais consumidoras da mineração. Em todas as suas etapas os
materiais utilizados são provenientes da
mineração: areia, os agregados como as britas e outras rochas, o cimento, o
aço, a cerâmica que faz os tijolos e também os acabamentos, até mesmo as tintas
são compostas por minérios.
É importante
entendermos o funcionamento da cadeia
produtiva na qual nossa profissão se enquadra e refletir essa compreensão
nas nossas escolhas projetuais, desde a técnica construtiva empregada, passando
pelos materiais e as tecnologias e processos envolvidos.
Skyline de
São Paulo. Image © Fernando Stankuns on VisualHunt - ArchDaily/Reprodução
A cadeia
produtiva ainda pode ser expandida, quando pensamos nos processos de fabricação
dos produtos em geral, como o cimento ou
os porcelanatos e tintas, por exemplo. Todos exigindo etapas de
industrialização que são amplamente apoiadas no minério: seja pelos
equipamentos utilizados, seja pela matéria prima.
Outro
exemplo está nos maquinários necessários
para produzir edifícios cada vez mais altos, guindastes, gruas e
cremalheiras, todos fabricados em aço ou outros derivados do ferro. Os grandes
centros urbanos do mundo são o produto, o resultado dos anos e anos de
mineração e outras formas de extração da terra.
Desde o
final do século XIX, o produto da mineração está correlacionado ao progresso. A
partir do uso do aço nas construções e do concreto armado, as cidades grandes foram ganhando forma com edifícios
altos, pontes imponentes e grandes obras viárias, o que foi também uma resposta
ao aumento populacional e o consequente adensamento das cidades e esvaziamento
das áreas rurais.
Até hoje,
porém, o desenvolvimento econômico impõe novas
construções como marcos urbanos, apoiando-se em novas arquiteturas para
criar uma imagem de alcance e apelo global, atraindo investimentos e interesse
do restante do mundo.
Empire State
Building . Image © Zugrocker on Visualhunt
- ArchDaily/Reprodução
Os grandes
desastres naturais vistos em Minas Gerais, mas também em outros estados
brasileiros e países, não são, portanto, acidente, mas consequência direta do modelo econômico mundial. Nos deparamos,
como sociedade e como profissionais, com o grande desafio de encontrar
alternativas para a matéria-prima mineral.
Como
arquitetos, engenheiros e trabalhadores da construção civil como um todo,
precisamos buscar uma atuação
profissional mais consciente, investir em novas tecnologias e investigar
formas de torná-las usuais no mercado e inclusive rever a necessidade de novas
construções. Ainda que seja difícil imaginar alternativas, precisamos
questionar as cidades que construímos e a forma como habitamos o planeta, e
como podemos evoluir.
Referências
VASCONSELOS, Sueli, 2020. Artigo do Estado de Minas Mineração em Minas Gerais: um cenário de desenvolvimento e impactos. Acesse aqui.
VIEIRA, d.
c.; GIANASI, l. m.; MARSHAL, j.; PERKINS, p. e.; OLIVEIRA, b. j. 2019.
Mineração, Desastres, Formação Crítica: Casos no Brasil e no Canadá.
Fonte: