(Foto: ArchDaily/Reprodução)
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Voltado a estudantes de arquitetura latino-americanos, o Prêmio Acero tem como objetivo promover e impulsionar ações complementares aos modelos pedagógicos para a concepção de ideias arquitetônicas inovadoras utilizando o aço como matéria-prima. A edição deste ano, que tinha como tema "Cidades e Comunidades Sustentáveis", premiou com o primeiro lugar uma equipe formada por dois estudantes brasileiros da FAUUSP.
“Arquitetura que não toca o chão” é o nome da proposta desenvolvida por Augusto Longarine e Luiz Sakata, com orientação do professor Luciano Margotto, que com o mesmo projeto venceram o 13º Concurso CBCA (Centro Brasileiro da Construção em Aço), a etapa nacional que antecede o Alacero. Veja o projeto a seguir, acompanhado do memorial escrito pelos estudantes.
Dos estudantes: O projeto vencedor traz uma nova maneira de se ver e entender a cidade, aproveitando-se dos espaços ociosos que ela geralmente apresenta para torná-la mais permeável e humana: a cidade encarada não como entrave, mas como solução possível de vida sustentável. Aposta no reaproveitamento de áreas residuais (empenas-cegas e coberturas ociosas, por exemplo) como solução viável para o adensamento de áreas dotadas de infraestrutura, como os centros urbanos. O projeto aproveita-se de uma situação já edificada e consolidada, no caso o Edifício Copan, no centro de São Paulo, para se instalar como um equipamento otimizador urbano.
(Imagem: ArchDaily Brasil/Reprodução)
A ideia principal é de que esses módulos programáticos aéreos se distribuam pela cidade, adotando diferentes formas, funções e programas. A agricultura urbana proposta no ensaio projetual prevê a redução do tráfego interno de caminhões e o processamento e manejo sustentável do lixo orgânico e do esgoto doméstico produzidos pelos condomínios verticais. Propõe ainda a produção e fruição de paisagens complexas e instigantes dentro dos centros urbanos, rompendo positivamente a separação convencional entre cidade e campo. A proposta aposta na replicação e versatilidade do aço como molde das cidades do século XXI.
LOCAL
São Paulo assume posição de destaque entre as maiores aglomerações urbanas do mundo desde a metade do século XX. A cidade paroquial transformou-se em cidade das oportunidades. O Centro, símbolo do progresso, verticalizou-se. Com o passar dos anos, apesar da grande infraestrutura instalada, perdeu sua relevância econômica, seus moradores e sua vitalidade. Paradoxalmente, a cidade continuou a expandir-se, ocupando várzeas, matas e rincões.
A discussão do adensamento urbano é indispensável para a sustentabilidade da ocupação humana no planeta. O adensamento é inevitável: áreas adensadas otimizam infraestrutura urbana, promovem a diversidade de usos e reduzem o tempo dos deslocamentos, privilegiando modais mais sustentáveis. Embora áreas centrais comumente apresentam escassez de solo urbano, o Centro de São Paulo abriga inúmeras oportunidades de ocupação alternativas, de empenas cegas à coberturas ociosas. O reaproveitamento de áreas residuais, sem identidade, “não-lugares” do antropólogo Marc Augé, é o mote deste projeto. A primeira resposta ao tema é o uso da cidade em sua plenitude, humanizando-a, aproveitando-se ao máximo de seu potencial aglutinador.
CONCEITO
Escolheu-se, como local de implantação do edifício-modelo, duas empenas simetricamente alinhadas localizadas em uma das quadras mais adensadas de São Paulo. É também um dos locais de maior circulação de pessoas da metrópole, cercado por vias de caráter metropolitano e massivo sistema de transporte público. Este projeto buscou inaugurar a sustentabilidade não apenas na esfera do novo, do que há de ser construído, mas também do outrora já edificado. Por esse motivo, mais do que fornecer novos espaços de ocupação ao Centro já saturado, insere-se como equipamento otimizador urbano: uma horta vertical cujos insumos básicos para a produção provém do próprio edifício “hospedeiro”.
O sistema prevê o recolhimento e tratamento das águas pluviais da cobertura para a irrigação do plantio, a compostagem do lixo orgânico doméstico para a produção de adubo e o processamento de parte dos efluentes condominiais para o fornecimento de biogás a todo o sistema. A produção é escoada pelo próprio edifício ao mercado vertical anexo à outra empena. Com o intuito de compartilhamento e democratização da infraestrutura urbana, propõe-se ainda que o edifício transforme-se em um percurso público entre o térreo da cidade e a cobertura do Edifício Copan, conhecida por abrigar um dos mirantes mais altos de São Paulo. Ao mesmo tempo, o percurso tem função educativa e conscientizadora: mais do que soluções pontuais de sustentabilidade, é imprescindível a difusão pública das mesmas.
ESTRUTURA
A oportunidade de uma arquitetura aérea engastada em edifícios hospedeiros explora o aço em sua leveza. A estrutura de múltiplos andares, por não apoiar-se no solo, distribui todas as cargas resultantes ao edifício adjacente. A solução, portanto, previu reduzir ao máximo as cargas permanentes atuantes na estrutura, seja pela redução e otimização da área dos pavimentos como pela seleção dos componentes estruturais de melhor relação peso/carregamento. O conjunto compartilha do mesmo desenho funcional, cujas cargas diminuem em direção às bordas.
No edifício-mercado, de menor carga permanente, tirantes laterais engastados no edifício hospedeiro sustentam as lajes, travadas horizontalmente por duas vigas centrais também engastadas. No edifício-horta, devido às maiores cargas permanentes, a solução estrutural acima é complementada por duas grandes “vigas-mãe” de aço VS2000x515 engastadas em um dos núcleos rígidos do edifício hospedeiro que, por meio de quatro pendurais, reforçam a estrutura. A transposição horizontal de 17 metros entre os edifícios, por sobre a Rua Araújo, é possibilitada pela utilização de vigas-vagão. Idealizado não como uma arquitetura pontual mas como sistema passível de replicação, em variados usos, o projeto encara o urbano não como problema, mas como solução de vida sustentável. Para isso, confia na versatilidade do aço como molde da cidade do século XXI.
PROGRAMA
Tratamento de Água
Prevê-se o recolhimento das águas pluviais da cobertura para irrigação do plantio, complementada, nos meses de estiagem, pela filtragem das águas cinzas (provenientes dos chuveiros, lavatórios, pias de cozinha e máquinas de lavar roupa) provenientes do condomínio.
Geração de Biogás
Parte dos efluentes condominiais seriam conduzidos aos biodigestores instalados, tanques completamente fechados que, ao impossibilitar a entrada de ar, aceleram a decomposição da matéria orgânica liberando biogás para geração de energia elétrica ao sistema.
Compostagem Seca
Parte do lixo orgânico produzido diariamente no edifício hospedeiro seria direcionado para um conjunto de composteiras responsáveis pela decomposição da matéria orgânica e pelo fornecimento de adubo para a horta vertical.
Auditórios
Espaços de estar, reuniões ou pequenas apresentações didáticas, aproveitando-se do potencial educativo do edifício para a construção das cidades do futuro pelas próximas gerações.
Horta Vertical
Produção de hortaliças, legumes e frutas a partir dos insumos coletados do próprio edifício hospedeiro. O sistema conta com estantes pivotantes metálicas rotacionadas de acordo com o melhor ângulo solar, podendo ocupar um ou dois pavimentos.
(Imagem: ArchDaily Brasil/Reprodução)
Térreos Elevados
Espaços de estar e de contemplação da paisagem urbana cujos vazios programáticos dialogam com os pavimentos livres de brises do Edifício Copan.
Transposição Aberta
Extensão pública da cobertura do edifício menor em direção ao edifício maior, onde uma escada/auditório convida o pedestre ao promenade.
Transposição coberta
Transposição coberta pública do edifício menor ao edifício maior, com rápido acesso às escadas e ao elevador.
Transposição Logística
Piso técnico de transposição entre o edifício maior e o edifício menor, dotado de esteira rolante industrial transportadora para o escoamento horizontal da produção da horta ao mercado vertical. O escoamento vertical é garantido por dois monta cargas logísticos.
Mercado Vertical
Comércio livre dos alimentos orgânicos produzidos pela horta vertical, localizado estrategicamente no edifício menor, mais próximo do térreo urbano, em um dos locais mais movimentados de São Paulo.
Fonte: