Foto de Didssph, via Unsplash - ArchDaily Brasil/Reprodução.
Com a urbanização desenfreada das cidades, os animais que originalmente tinham esses ambientes como lar foram deslocados e forçados a encontrar outros meios de refúgio.
Os pássaros talvez sejam uma das espécies mais atingidas pelo crescimento urbano já que são atraídos durante o voo por estímulos como iluminação e correntes de ar que podem ser transformadas dependendo de como se deu o processo construtivo e de organização territorial de uma cidade.
Quais são os principais causadores dos danos aos pássaros e quais seriam as possíveis soluções?
Fachadas de vidro e feixes de luz
O aumento astronômico de edifícios que utilizam fachadas totalmente envidraçadas resultou na morte estimada de pelo menos um bilhão de pássaros a cada ano, somente nos EUA.
Exteriores de vidro brilhante, plantas internas perto de janelas e paisagismo perto de edifícios podem ser mortais para os pássaros, pois eles são incapazes de distinguir os reflexos no vidro do céu aberto.
Após a perda de habitat, esta é a segunda maior ameaça feita pelo homem que as aves enfrentam a cada ano. Em resposta, áreas urbanas como a cidade de Nova York introduziram leis locais para atualizar os códigos de construção para tornar as novas estruturas de vidro mais seguras para os pássaros.
Embora essas medidas sejam um importante passo à frente, os arquitetos devem pensar grande e não apenas optar por designs amigáveis aos pássaros em seus projetos, mas também trabalhar para ajudar a comunidade aviária a prosperar.
Foto de Jonathan Simcoe, via Unsplash - ArchDaily Brasil/Reprodução.
Essa questão é tão séria que dados levantados pela ONG SOS Aves & Cia, no Rio de Janeiro, apontam que 70% das aves socorridas pela organização são vítimas de vidros e edifícios espelhados. Já no Reino Unido, o British Trust for Ornithology (Fundo Britânico para Ornitologia) estimou que as janelas causam 100 milhões de colisões de aves no país a cada ano. Um terço destes são fatais.
Outro grave problema é a questão da iluminação urbana.
Mais de 100 anos atrás, o anatomista e ornitólogo irlandês Charles Patten foi trabalhar em um farol no litoral da Irlanda, onde observou esse fenômeno ao vivo. Segundo seus relatos, revoadas alucinantes de pássaros migratórios voavam em direção ao farol e, infelizmente, batiam em suas janelas.
Muitas dessas aves morriam, o que permitiu que Patten as recolhesse e estudasse. Mas, naquela época, as fontes de luz artificial muito brilhante eram pouco comuns, enquanto hoje a luz elétrica é visível à noite em praticamente todos os lugares.
Desligar mais luzes à noite durante a migração das aves poderá salvar a vida de milhares de pássaros, segundo ele. Um estudo publicado em 2021 estimou que, se a metade das luzes for desligada na primavera e no outono, a mortalidade das aves poderá ser reduzida em cerca de 60%.
Construções ancestrais e pássaros
Durante séculos, pássaros como pombos desempenharam um papel significativo nas economias e na cultura de civilizações antigas como a Pérsia, a região histórica do sudoeste da Ásia que hoje é o atual Irã. Os pombos fazem parte do Oriente Médio desde o início da agricultura, como a ave domesticada mais antiga do mundo, com pesquisas sugerindo que eles viviam em cativeiro há mais de 10.000 anos.
À medida que as práticas agrárias começaram a evoluir na antiga Pérsia, os agricultores perceberam que os excrementos dos pombos eram excelentes fertilizantes e, posteriormente, começaram a construir torres para criar e abrigar essas aves.
Rico em fósforo, potássio e nitrogênio, os excrementos dos pombos forneciam o fertilizante necessário para melões, pepinos, trigo e outras culturas que demandavam nitrogênio – todos os pilares da culinária persa.
Torres de pombos de Isfahan. Imagem via Iran Tourism and Touring Organization - ArchDaily Brasil/Reprodução.
Isfahan é famosa por sua rica tradição de torres de pombos. A maioria das estruturas ainda existentes datam do século XVII. A arquitetura dessas torres adapta a arquitetura vernacular do Irã para atender às necessidades das aves; majestosas torres abobadadas com uma estrutura interna em forma de favo de mel atingem seis andares de altura e 50 a 75 pés de diâmetro.
As aves podem acessar seus ninhos através de passagens pequenas e estreitas que as protegem de predadores como cobras ou pássaros maiores. Uma vez por ano, os agricultores acedem a estas pequenas cavidades para extrair os seus excrementos, proporcionando simultaneamente um refúgio seguro a estes animais e beneficiando a produção agrícola da comunidade local.
Arquitetos que integraram as aves
No Parc Güell de Barcelona, Antoni Gaudí projetou intencionalmente elementos arquitetônicos que permitiriam a nidificação de pássaros e pombos. Ele construiu longas paredes com terraços e torres que incorporavam ninhos para pombos e uma variedade de outras aves para residir, incentivando sua interação com a arquitetura em vez de tentar evitá-la.
Espaço para pássaros no Parc Guell. Foto: Site oficial do Parc Guell - ArchDaily Brasil/Reprodução.
O Pombal de Oscar Niemeyer (1960), em Brasília, pode ser a torre de pombos mais reconhecida dos últimos tempos. Com aberturas espelhadas em ambos os lados, esta gigantesca torre de concreto fica no centro da Praça dos Três Poderes, no coração da capital do Brasil. Seu interior é construído com fileiras finas de prateleiras horizontais de concreto que permitem que centenas de pombos se empoleirem.
O monumento foi inaugurado em 1961, durante o governo de Jânio Quadros. De acordo com o professor emérito da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da UnB, José Carlos Coutinho, foi a primeira-dama Eloá Quadros que pediu a Niemeyer que projetasse um pombal, por acreditar que toda praça deveria ter pombos.
O Pombal de Niemeyer. Foto de Hanne Therkildsen, via Flickr. Licença CCO - ArchDaily Brasil/Reprodução.
Embora a torre seja puramente escultural e não se envolva nas práticas agrícolas benéficas que os pombos podem ajudar a implementar, símbolos arquitetônicos como este são importantes para mudar o sentimento coletivo de que os pássaros são um incômodo a ser tolerado em ambientes urbanos.
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