Empatia e pensamento crítico: revisitando competências na liderança



Empatia e pensamento crítico: revisitando competências na liderança


Nas intervenções em desenvolvimento humano, quer sejam em organizações empresariais, na orientação de carreira, na sala de aula e até mesmo na clínica, tenho me permitido fazer reflexões e indagações. Tenho receio dos que fazem das receitas seu principal recurso e que acreditam, ou pelo menos afirmam, deter fórmulas milagrosas para problemas complexos. Cada organização, líder, pessoa, turma são únicos. 


Uma dessas indagações paira sobre as competências comportamentais e sua articulação à gestão organizacional, pois é fato que o mundo corporativo tem valorizado tais competências, também conhecidas pela expressão soft skills. Destaco a empatia e o pensamento crítico, porque os considero pilares da carreira de qualquer profissional, especialmente dos líderes. 


Isso posto, creio ser importante revisitar os conceitos. Para Carl Rogers, uma das maiores referências no trato das relações humanas, a empatia envolve um exercício de flexibilidade em tomar distância da sua própria perspectiva para abrir-se ao olhar do outro, sem perder-se. Trata-se de uma conexão que desperta um elevado sentimento de valor pessoal a quem for direcionada. 


No que tange ao pensamento crítico, José Pinto Lopes e Helena Santos Silva, em recente publicação, lembram que é preciso superar a conotação negativa que ainda predomina em alguns ambientes, pois “o termo pensamento crítico chama atenção para a qualidade do pensamento necessário para formular e resolver problemas de forma competente, tomar decisões acertadas, analisar questões, realizar investigações profundas, etc. ”(LOPES; SILVA, 2021, p. 13). Assim, o pensamento crítico admite, analisa, instiga a compreensão de outras formas de perceber a realidade. Duas competências que muito contribuem para enfrentar os múltiplos desafios que perpassam as organizações no cenário atual.


Mencionarei o contexto de uma organização em que realizei uma consultoria, cujos líderes agiram como seguidores acríticos. Reconheci, neste exemplo, similaridades do que acontece em outras organizações. Tomei, obviamente, os cuidados para manter a identidade sob sigilo. 


A história começou com um convite aos consultores da área de gestão, o clássico trabalho motivacional, mas no primeiro contato percebi a necessidade de uma intervenção mais ampla. Então, propus a realização de um diagnóstico organizacional, parte primordial da consultoria na qual associamos diversos instrumentos e metodologias: escalas e inventários, entrevistas, trabalho em grupo e observação direta. Neste processo, realizado em equipe, buscamos perceber o que é dito, o não dito, as contradições entre o que está prescrito e a realidade, revelada nas manifestações verbais e não verbais, nas decisões e ações da organização.


Um robusto relatório foi discutido entre nossos consultores, a equipe da área de gestão de pessoas e a diretoria da organização. Cabe adiantar que a consultoria terminou por ali e que, recentemente, um convite para submeter uma nova proposta foi feito sob alegação de que a situação estava crítica e buscavam “dar um novo rumo aos negócios”. Por outros motivos, decidimos não participar. 


Em síntese, esta organização estava em meio a uma reestruturação iniciada há pelo menos dois anos. Até aí, nada novo. O mundo muda, as organizações precisam se adequar e, portanto, mudar é inevitável. Tal processo envolvia, no âmbito da gestão de pessoas, mudanças na estrutura de cargos e salários, recompensas, critérios para seleção e avaliação de pessoal. Embora os profissionais desta organização fossem denominados “parceiros do negócio”, havia certa obscuridade quanto ao conhecimento e visão acerca de todo esse processo. 


Um programa de formação de líderes capacitava-os a exercer aquela que parecia ser a pedra angular da liderança: o poder de influenciar. Assim, estimulados pelos líderes, novos projetos emergiram e resultados significativos foram sendo apresentados, mas, infelizmente, não estava tudo bem.


Esse clima durou pouco, pois a organização, com a participação ativa dos líderes, colocou em prática o que chamo de “gestão por conveniência”. Duas práticas servem para ilustrar: os remanejamentos de unidade produtiva, setor, cargo e até de cidade e o repasse de projetos a profissionais com pouca vivência, alguns recém contratados. Os remanejamentos, de modo frequente, desconsideravam interesses pessoais, impactando a qualidade de vida dos envolvidos. 


O repasse dos projetos, em regra, era feito a contragosto dos seus idealizadores, menosprezando os resultados e sem aparente contrapartida. Frente aos questionamentos, o jargão era o mesmo: “precisamos ser flexíveis”. Na sequência, a obscuridade do processo desenvolveu uma desconfiança, que configurou um sentimento coletivo de injustiça, o que obviamente impactou o clima organizacional. 


Por vezes, no entanto, em tempos difíceis, o pensamento crítico e a empatia parecem colocar em xeque a suposta “segurança” ofertada por organizações que insistem em reproduzir modelos entusiasmados que desgastam as relações em pouco tempo, pela falta de consistência no que defendem. 


É preciso estar alerta, visto que a carreira de um profissional, notadamente dos líderes, não é restrita a uma organização, mas à qualidade da sua atuação. E a qualidade não é reconhecida apenas pelos dirigentes da organização, mas por seus pares (mesmo que de outras áreas) e aqueles que tiveram a “sorte” de ser por eles liderados. Eles ocuparão outros espaços, posições e poderão ser ponte para transições e boas oportunidades ocupacionais.  Aprimore o exercício da empatia e pensamento crítico, por você, pela organização que integra e por sua carreira. A pós-graduação do INBEC é uma excelente oportunidade. 



Jacinta Maria Grangeiro Carioca

Psicóloga Organizacional e Clínica, Mestre em Administração, Consultora de Desenvolvimento Humano e Docente 





Pós-Graduação