Economia Circular: novo sistema que pode atender às nossas necessidades dentro dos limites planetários



Economia Circular: novo sistema que pode atender às nossas necessidades dentro dos limites planetários
(Foto: The Ellen MacArthur Foundation/Reprodução)
 

O modelo econômico ‘extrair, transformar, descartar’ da atualidade está atingindo seus limites físicos. A economia circular é uma alternativa atraente que busca redefinir a noção de crescimento, com foco em benefícios para toda a sociedade. Isto envolve dissociar a atividade econômica do consumo de recursos finitos, e eliminar resíduos do sistema por princípio.

 

Apoiada por uma transição para fontes de energia renovável, o modelo circular constrói capital econômico, natural e social. Ele se baseia em três princípios:

 

·         Eliminar resíduos e poluição por princípio

·         Manter produtos e materiais em ciclos de uso

·         Regenerar sistemas naturais

 

 

O conceito de uma economia circular

 

Em uma economia circular, a atividade econômica contribui para a saúde geral do sistema. O conceito reconhece a importância de que a economia funcione em qualquer escala – para grandes e pequenos negócios, para organizações e indivíduos, globalmente e localmente.

 

A transição para uma economia circular não se limita a ajustes visando a reduzir os impactos negativos da economia linear. Ela representa uma mudança sistêmica que constrói resiliência em longo prazo, gera oportunidades econômicas e de negócios, e proporciona benefícios ambientais e sociais.

 

O modelo faz uma distinção entre ciclos técnicos e biológicos. O consumo se dá apenas nos ciclos biológicos, onde alimentos e outros materiais de base biológica (como algodão e madeira) são projetados para retornar ao sistema através de processos como compostagem e digestão anaeróbica.

 

Esses ciclos regeneraram os sistemas vivos, tais como o solo, que por sua vez proporcionam recursos renováveis para a economia. Ciclos técnicos recuperam e restauram produtos, componentes e materiais através de estratégias como reuso, reparo, remanufatura ou (em última instância) reciclagem.

 

O modelo de economia circular sintetiza uma série de importantes escolas de pensamento, incluindo a economia de performance de Walter Stahel; a filosofia de design Cradle to Cradle de William McDonough e Michael Braungart; a ideia de biomimética articulada por Janine Benyus; a economia industrial de Reid Lifset e Thomas Graedel; o capitalismo natural de Amory e Hunter Lovins e Paul Hawkens; e a abordagem blue economy como descrita por Gunter Pauli.

  


Re-thinking Progress: The Circular Economy

 

São infinitas as oportunidades de repensar e redesenhar nossa forma de produzir. O video ‘Re-thinking Progress’ explora como uma mudança de perspectiva nos permitiria redesenhar a nossa economia – concebendo produtos que possam ser projetados para a remanufatura e alimentando o sistema com energia renovável. Poderíamos, com criatividade e inovação, construir uma economia restaurativa?

 

Confira o vídeo da Ellen MacArthur Foundation que ilustra de maneira simples o que é economia circular:

 

 

 

Princípios

 


(Foto: The Ellen MacArthur Foundation/Reprodução)
 

A economia circular oferece diversos mecanismos de criação de valor dissociados do consumo de recursos finitos. Em uma economia circular verdadeira, o consumo só ocorre em ciclos biológicos efetivos. Afora isso, o uso substitui o consumo. Os recursos se regeneram no ciclo biológico ou são recuperados e restaurados no ciclo técnico. No ciclo biológico, os processos naturais da vida regeneram materiais, através da intervenção humana ou sem ela.

 

No ciclo técnico, desde que haja energia suficiente, a intervenção humana recupera materiais e recria a ordem em um tempo determinado. A manutenção ou o aumento do capital têm características diferentes nos dois ciclos.

 

A economia circular fundamenta-se em três princípios, cada um deles voltado para diversos desafios relacionados a recursos e sistêmicos que a economia industrial enfrenta.

  


Princípio 1: Preservar e aumentar o capital natural

... controlando estoques finitos e equilibrando os fluxos de recursos renováveis.

 

Isso começa com a desmaterialização dos produtos e serviços – com sua entrega virtual, sempre que possível. Quando há necessidade de recursos, o sistema circular seleciona-os com sensatez e, sempre que possível, escolhe tecnologias e processos que utilizam recursos renováveis ou apresentam melhor desempenho.

 

Uma economia circular também aumenta o capital natural estimulando fluxos de nutrientes no sistema e criando as condições necessárias para a regeneração (como, por exemplo, a do solo).

  


Princípio 2: Otimizar a produção de recursos

... fazendo circular produtos, componentes e materiais no mais alto nível de utilidade o tempo todo, tanto no ciclo técnico quanto no biológico.

 

Isso é sinônimo de projetar para a remanufatura, a reforma e a reciclagem, de modo que componentes e materiais continuem circulando e contribuindo para a economia.

 

Sistemas circulares usam circuitos internos mais estreitos sempre que preservam mais energia e outros tipos de valor, como a mão de obra envolvida na produção. Esses sistemas também mantêm a velocidade dos circuitos dos produtos, prolongando sua vida útil e intensificando sua reutilização.

 

Por sua vez, o compartilhamento amplia a utilização dos produtos. Sistemas circulares também estendem ao máximo o uso de materiais biológicos já usados, extraindo valiosas matérias-primas bioquímicas e destinando-as a aplicações de graus cada vez mais baixos.

 

 

Princípio 3: Fomentar a eficácia do sistema

... revelando as externalidades negativas e excluindo-as dos projetos.

 

Isso inclui a redução de danos a produtos e serviços de que os seres humanos precisam, como alimentos, mobilidade, habitação, educação, saúde e entretenimento, e a gestão de externalidades, como uso da terra, ar, água e poluição sonora, liberação de substâncias tóxicas e mudança climática.


Características

 


(Foto: The Ellen MacArthur Foundation/Reprodução)

 

 Embora os princípios de uma economia circular atuem como princípios para a ação, as seguintes características fundamentais descrevem a economia circular pura:


 
 

Design sem resíduo

Resíduos não existem quando os componentes biológicos e técnicos (ou 'materiais') de um produto são projetados com a intenção de permanecerem dentro de um ciclo de materiais biológicos ou técnicos, concebidos para desmontagem e ressignificação.

 

Os materiais biológicos não são tóxicos e podem ser, simplesmente, compostados. Materiais técnicos, como polímeros, ligas e outros materiais sintéticos são projetados para ser usados novamente com o mínimo de energia e maior retenção de qualidade (ao passo que a reciclagem, como normalmente entendida, resulta numa redução da qualidade e realimenta o processo com matéria prima bruta).

 

 

Criar resiliência através da diversidade

Modularidade, versatilidade e adaptabilidade são características que precisam ser priorizadas em um mundo de incertezas e em rápida evolução. Sistemas diversos com muitas conexões e escalas são mais resistentes a choques externos do que os sistemas construídos simplesmente para a eficiência – maximizando o rendimento a partir de resultados extremos nas fragilidades.

 

 

Transitar para o uso de energia proveniente de fontes renováveis

Os sistemas devem operar com energia renovável - energia renovável, o que é permitido pelos reduzidos limiares dos níveis de energia exigidos por uma economia circular e restaurativa. O sistema de produção agrícola se baseia no atual rendimento da energia solar, mas quantidades significativas de combustíveis fósseis são utilizadas em fertilizantes, máquinas, processamentos e através da cadeia de produtiva.

 

Sistemas alimentares e agrícolas mais integrados reduziriam a necessidade de insumos à base de combustíveis fósseis e capturariam mais valor energético dos subprodutos e adubos.

  


Pensar em 'sistemas'

A capacidade de compreender como as partes se influenciam mutuamente dentro de um todo, e as relações do todo com as partes, é essencial. Os elementos são considerados em relação ao seu contexto ambiental e social.

 

Embora uma máquina também seja um sistema, ela está claramente delimitada a ser determinista. O pensamento sistêmico geralmente refere-se à maioria esmagadora dos sistemas do mundo real: são não-lineares, ricos em feedback (retroalimentação), e interdependentes. Em tais sistemas, imprecisas condições de partida combinadas com feedback levam a consequências muitas vezes surpreendentes, e a resultados que frequentemente não são proporcionais à entrada (feedback 'não amortecido' ou descontrolado).

 

Tais sistemas não podem ser geridos no sentido convencional, "linear", exigindo, pelo contrário, mais flexibilidade e frequente adaptação a mudanças das circunstâncias.

  


Pensar em cascatas

Para os materiais biológicos, a essência de criação de valor reside na possibilidade de extrair valor adicional de produtos e materiais em cascata através de outras aplicações. Na decomposição biológica, seja ela natural ou em processos de fermentação controlada, o material é desintegrado em fases por microorganismos como bactérias e fungos que extraem energia e nutrientes dos carboidratos, gorduras e proteínas encontrados no material.

 

Por exemplo, uma árvore indo para o forno renuncia o valor que poderia ser aproveitado através das etapas de decomposição por meio de usos sucessivos da madeira e produtos madeireiros antes da degradação e eventual incineração.

  


Escolas de pensamento

O conceito de economia circular tem origens profundamente enraizadas que não podem ser ligadas a uma única data ou autor. Suas aplicações práticas para os sistemas econômicos modernos e processos industriais, no entanto, adquiriram uma nova dinâmica desde o fim da década de 1970, lideradas por um pequeno número de acadêmicos, líderes intelectuais e empresas.

 
(Foto: The Ellen MacArthur Foundation/Facebook/Reprodução)
  

 

O conceito genérico tem sido aperfeiçoado e desenvolvido pelas seguintes escolas de pensamento:

  


Design Regenerativo

Nos Estados Unidos, John T. Lyle começou a desenvolver ideias de design regenerativo que poderiam ser aplicados para todos os sistemas, ou seja, para além da agricultura, para o qual o conceito de regeneração havia sido formulado anteriormente.

 

Indiscutivelmente, ele estabeleceu as bases do framework de economia circular as quais foram notavelmente desenvolvidas e ganharam notoriedade graças ao Bill McDonough (que havia estudado com Lyle), Michael Braungart e Walter Stahel. Hoje, o Centro Lyle de Estudos Regenerativos oferece cursos sobre o assunto.


Economia de Performance

Walter Stahel, arquiteto e economista, em 1976 esboçou em seu relatório de pesquisa para a Comissão Europeia, “O Potencial de Substituir Mão-de-Obra por Energia”, em coautoria com Genevieve Reday, a visão de uma economia em ciclos (ou economia circular) e seu impacto na criação de emprego, competitividade econômica, redução de recursos e prevenção de desperdícios. Creditado por ter cunhado o termo "Cradle to Cradle" (Berço a Berço) no final de 1970, Stahel trabalhou no desenvolvimento de uma abordagem de “ciclo fechado” para processos de produção e criou o Product Life Institute, em Genebra há mais de 25 anos.

 

O Product Life Institute busca os principais objetivos: extensão da vida do produto, bens de vida longa, atividades de recondicionamento e prevenção de desperdício. Também insiste na importância de vender serviços ao invés de produtos, uma ideia referida como “economia de serviço funcional” agora mais amplamente incluída dentro da noção de “economia de performance”.

 

Stahel argumenta que a economia circular deveria ser considerada um framework: como um conceito genérico, a economia circular baseia-se em várias abordagens mais específicas que gravitam em torno de um conjunto de princípios básicos.

 


(Foto: The Ellen MacArthur Foundation/Facebook/Reprodução)
  


Cradle to Cradle – Do berço ao Berço

O químico alemão e visionário, Michael Braungart, continuou a desenvolver, em conjunto com o arquiteto americano Bill McDonough, o conceito e o processo de certificação Cradle to Cradle™. Essa filosofia de projeto considera todos os materiais envolvidos nos processos industriais e comerciais para serem nutrientes, dos quais há duas principais categorias: técnicos e biológicos.

 

O framework Cradle to Cradle é focado no design para a efetividade em termos de produtos com impacto positivo e redução dos impactos negativos da comercialização através da efetividade.

 

O design Cradle to Cradle compreende os processos seguros e produtivos do “metabolismo biológico” da natureza, como um modelo para desenvolver um fluxo de “metabolismo técnico” de materiais industriais. Componentes do produto podem ser projetados para a recuperação contínua e reutilização como nutrientes biológicos e técnicos dentro desses metabolismos. O framework Cradle to Cradle inclui entradas de energia e de água.

 

Elimina o conceito de resíduo. "Resíduo é igual a alimento." Projeta produtos e materiais com ciclos de vida que são seguros para a saúde humana e para o meio ambiente e que podem ser reutilizados constantemente por meio de metabolismos biológicos e técnicos. Criar e participar de sistemas de coleta e recuperar o valor desses materiais seguindo seu uso.

 

Energia com fontes renováveis. “Usa a atual incidência de energia solar”. Maximizar o uso de energias renováveis.

 

• "Celebra a diversidade". Gerencia o uso da água para maximizar a qualidade, promover ecossistemas saudáveis, e respeita os impactos locais. Guia operações e relações com os stakeholders utilizando responsabilidade social.

  


Ecologia Industrial

“Ecologia industrial é o estudo dos fluxos de materiais e energia nos sistemas industriais”. Concentrando-se em conexões entre operadores dentro do “ecossistema industrial”, essa abordagem visa à criação de processos de ciclo fechado nos quais os resíduos servem como insumo, eliminando assim a noção de um subproduto indesejável.

 

A Ecologia Industrial adota um ponto de vista sistêmico, projetando processos de produção de acordo com as restrições ecológicas locais, enquanto observa seu impacto global desde o início, e procura moldá-los para que funcionem o mais próximo possível dos sistemas vivos.

 

Este framework é muitas vezes referido como a “ciência da sustentabilidade”, dada a sua natureza interdisciplinar, e seus princípios podem ser também aplicados no setor de serviços. Com ênfase na restauração do capital natural, a Ecologia Industrial foca também no bem-estar social.

 


(Foto: The Ellen MacArthur Foundation/Facebook/Reprodução)
  


Biomimética

Janine Benuys, autora de Biomimética: Inovação Inspirada pela Natureza, define sua abordagem como uma "nova disciplina que estuda as melhores ideias da natureza e então imita esses designs e processos para solucionar os problemas humanos”. Estudar uma folha para inventar uma melhor célula solar é um exemplo.

 

Ela pensa nisso como "inovação inspirada pela natureza”. A biomimética se baseia em três princípios fundamentais:

 

Natureza como modelo: estudar modelos da natureza e simular essas formas, processos, sistemas e estratégias para solucionar os problemas humanos.

 

Natureza como medida: usar um padrão ecológico para julgar a sustentabilidade das nossas inovações.

 

Natureza como mentora: ver e valorar a natureza não com base no que nós podemos extrair do mundo natural, mas no que podemos aprender com ele.

  


Blue Economy

Iniciado pelo ex CEO da Ecover e empresário belga Gunter Pauli, a Blue Economy é um movimento open source, que reúne estudos de casos concretos, inicialmente compilados em um relatório homônimo e entregue ao Clube de Roma.

 

Como afirma o manifesto oficial, “usando os recursos disponíveis em sistemas em cascataeamento (...) os resíduos de um produto se tornam insumos para criar um novo fluxo de caixa”. Baseado em 21 princípios base, a Blue Economy insiste em soluções determinadas por seu ambiente local e suas características físicas/ecológicas, colocando a ênfase na gravidade como a fonte primária de energia.

 

O relatório, que se desdobra como o manifesto do movimento, descreve “100 inovações que podem criar 100 milhões de empregos nos próximos 10 anos”, e oferece muitos exemplos de projetos de sucesso de cooperação “Sul-Sul” – uma outra característica original desta abordagem que tem a intenção de promover seu foco prático.

 

 

Fundação Ellen MacArthur

 


(Foto: Solvay/Reprodução)

 

A ex-velejadora Ellen MacArthur iniciou a Fundação Ellen MacArthur em 2010 para promover o conceito. Desde então, a fundação tem tido uma grande influência em ressoar essas ideias entre líderes governamentais, corporações globais e instituições acadêmicas.

 

Várias celebridades endossaram a economia circular e seus princípios do berço ao berço (Cradle to Cradle/C2C). Brad Pitt é um dos fundadores do Instituto de Inovação de Produtos do Berço ao Berço (C2CPII), enquanto colegas como Arnold Schwarzenegger, Meryl Streep, Susan Sarandon e Will.i.am também apoiam a causa.

 

A Fundação Ellen MacArthur é especializada em difundir e apoiar a mudança das empresas para esse novo modelo, que é capaz de gerar mais de um trilhão de dólares de lucro para a economia global. Foi criada uma rede de parceria entre empresas (líderes e emergentes) para colaborarem no salto coletivo para essa nova estrutura, essa união foi chamada “CE100” (Circular Economy Hundred). Nomes como Coca-Cola, Unilever, Philips e Renault estão na lista.

 

Além da óbvia vantagem comercial, a parceria também cria uma rede coletiva de solução de problemas, a construção de uma biblioteca com guias práticos para os respectivos negócios alcançarem sucesso com rapidez, e também proporcionar mecanismos para integrar a economia circular dentro de cada empresa.

 

Parece utopia para você? Pois saiba que diversas empresas já adotam essa abordagem. Em parceria com a Fundação Ellen MacArthur, o Google quer incorporar o conceito de economia circular na infraestrutura, na operação e na cultura da empresa.

 


(Foto: The Ellen MacArthur Foundation/Facebook/Reprodução)
  


O Reino Unido já é 19% circular

Uma análise de fluxo de materiais conduzida em 2010 pelo Waste & Resources Action Programme (WRAP – Programa de Ação de Resíduos e Recursos) estimou que um quinto (em peso) da economia do Reino Unido já opera de forma circular. Os 19% se referem ao peso de materiais (600 milhões de toneladas) entrando na economia comparado à quantidade de material reciclado (115 milhões de toneladas).

 

Projeções futuras realizadas pelo WRAP apontam que esse número poderia chegar a quase 27% em 2020, se 137 milhões de toneladas forem recicladas de uma entrada de material menos direta de 510 milhões de toneladas.

  

Fontes:

- 10 coisas que você precisa saber sobre a economia circular

- O que é Economia Circular?

- Economia circular


Pós-Graduação