(Foto: Flick/CBIC/Reprodução)
O futuro da indústria da Construção Civil está desenhado, projetado
em três dimensões e planejado com precisão milimétrica para injetar
competitividade no setor e reduzir os custos das obras. A
tecnologia BIM (Building Information Modeling), vista como revolucionária
no planejamento, execução e manutenção de empreendimentos, avança no País.
O momento de otimismo com sua disseminação ficou evidente no 2º Seminário Internacional BIM CBIC - o
BIM em Obras Públicas, realizado em Brasília no dia 30 de maio. Organizado
pela Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), em correalização do
SENAI Nacional, o evento contou com 450 inscritos, que se acomodaram no
auditório do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT).
Os participantes acompanharam os painéis sobre a tecnologia, que permite fazer modelos virtuais dos
empreendimentos e simular o passo a passo de sua execução, fazendo com que, já
na fase de planejamento, seja possível quantificar o material necessário e
solucionar problemas que, em outros tempos, só seriam diagnosticados no
canteiro de obras. “Nem se discute mais se
o BIM é importante ou não. É, e
acabou-se. Agora temos de fazer acontecer. Temos de contar com o envolvimento de toda a cadeia produtiva, de todos os
que estão capacitados para, assim, melhorar a competitividade e produtividade
do setor”, analisou José Carlos Martins, presidente da CBIC.
Vanessa Canhete, especialista em desenvolvimento industrial
na unidade de Inovação e Tecnologia do SENAI Nacional, reforçou o
papel relevante do BIM como impulsionador do crescimento da indústria:
“Acreditamos na importância do BIM para o futuro da Construção Civil. Já
atuamos fazendo consultoria, capacitação profissional, acompanhamento e desenvolvimento
de projetos. Nosso grande objetivo é que nós tenhamos cada vez mais a expansão desses serviços dentro de uma
atuação nacional”.
O avanço do BIM se dá, também, pela sinalização governamental de que a tecnologia é uma prioridade.
No ano passado, a publicação do decreto
que estabeleceu a Estratégia Nacional de Disseminação do BIM foi um marco
do compromisso do governo federal com a inovação no setor da construção. O resultado
é que órgãos públicos como o DNIT
têm se equipado para se inserir na nova realidade. “A gente vê o interesse
e o alinhamento do DNIT com o governo federal. O País carece de investimento, e
a parte de infraestrutura vai contribuir bastante para o desenvolvimento do
Brasil”, destacou Washington Luke, coordenador-geral de Operações Rodoviárias
da autarquia.
O DNIT, aliás, foi um dos casos apresentados no primeiro
painel do evento, intitulado “BIM para infraestrutura pública”, em que as
iniciativas do órgão foram detalhadas. No mesmo painel, o finlandês Tarvo Savolainen,
convidado especial do evento e especialista-chefe da Finnish Transport
Infrastructure Agency (FTIA; em tradução livre, Agência Finlandesa de Infraestrutura),
detalhou os avanços da FTIA na adoção de
BIM.
O segundo painel trouxe exemplos de obras
de prédios públicos planejados com as novas ferramentas, com o
detalhamento dos planos para a nova sede da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) de
Minas Gerais e o uso de BIM em edificações do Ministério Público do Distrito
Federal e Territórios (MPDFT).
Para encerrar os debates, o terceiro painel discorreu sobre ações institucionais para impulsionar o avanço do BIM no Brasil. Foram apresentadas as iniciativas e planos do governo federal e o andamento do processo de elaboração de normas técnicas de BIM. Também foi lançado o BIM Fórum Brasil, entidade que reunirá todos os atores interessados no uso da tecnologia para discuti-la e ampliar sua disseminação. “Estamos esperançosos com o futuro. Vimos aqui a riqueza e a variedade dos temas que foram tratados. Há uma surpresa positiva com a quantidade de projetos em BIM que estão acontecendo no País”, resumiu Dionyzio Klavdianos, presidente da Comissão de Materiais, Tecnologia, Qualidade e Produtividade (Comat) da CBIC.
Especialista
finlandês defende acesso total aos dados e padronização do BIM
(Foto: Flick/CBIC/Reprodução)
Abertura
completa dos dados e padronização para que “todos falem a mesma
língua”. Não foram poucas as vezes em que Tarvo Savolainen, especialista chefe
em BIM da Finnish Transport Infrastructure Agency (FTIA), a agência finlandesa
de infraestrutura do transporte, bateu nestas duas “teclas” em sua apresentação
no 2º Seminário Internacional BIM CBIC – O BIM em Obras Públicas.
No evento, promovido pela CBIC, em correalização com o
SENAI Nacional, Savolainen apresentou o caso da Finlândia, pioneira na utilização de BIM em obras públicas e, mais especificamente,
na adoção da tecnologia para modelar, executar e manter empreendimentos de
infraestrutura. A transparência total com todos os atores do processo, para que
possam colaborar e dialogar desde o projeto até a execução, ajudou os nórdicos
a se consolidarem como uma referência no
uso do BIM.
Estabelecer
padrões de utilização é o caminho para o futuro, já que a área de infraestrutura
ainda se adapta à nova tecnologia. “Queremos que todas as etapas sejam
adaptadas para BIM. Há sempre problemas quando você vai do design à construção,
e vários deles são abordados, mas a informação flui da melhor forma por todo o
ciclo quando
se utiliza o BIM desde o design e planejamento até a execução. Sabemos que
há muito ainda a ser feito, mas o BIM na Finlândia já avançou bastante”, destacou
o painelista.
Responsável pelas rodovias, ferrovias e hidrovias do país,
a FTIA exige a utilização do BIM em projetos desde 2014. Em 2017, publicou as diretrizes sobre a adoção da
tecnologia, dando o primeiro passo para a padronização defendida por Savolainen:
“São três fatores importantes estabelecidos para chegarmos a um formato totalmente
aberto: o sistema de classificação,
determinando a terminologia que todos deveriam seguir; os requisitos de BIM para infraestrutura, que delineia como trabalhar
com BIM; e as trocas de informação”.
O cuidado ao lidar com os dados, seja pela preocupação em
abri-los sem restrições, seja pelo esforço de torná-los claros, utilizando
padrões previamente estabelecidos, é uma forma de construir o conhecimento sobre a ferramenta e compartilhá-lo. “Nós
padronizamos a estrutura para informação, documentação e transferência de
dados. Você tem que saber exatamente como é feito para que a informação seja
passada a frente”, ressalta Savolainen.
A partir do cumprimento dessas diretrizes, a Finlândia
constrói um ciclo de produção de conhecimento, em que todos os agentes contribuem para um projeto e, assim, fazem a adoção
do BIM se tornar mais eficiente, em um processo de desenvolvimento que se
torna útil para os próximos empreendimentos. “Temos de trabalhar com informação
que seja fácil de ser utilizada. Estamos lidando com muitos setores,
empreiteiros, empresas de manutenção. Na próxima fase, o ator pode ser muito
diferente do anterior. Queremos enriquecer nossas ferramentas de informação
durante todo o ciclo. Quando chega à fase de manutenção, a informação que foi
enriquecida deve ser usada para o
próximo planejamento”, afirma Savolainen.
Países
nórdicos são pioneiros na adoção das novas ferramentas

(Foto: Flick/CBIC/Reprodução)
Os movimentos no Brasil para disseminação
do BIM, que tem na CBIC um de seus principais atores, podem colocar o País no
caminho de uma revolução que se espalha pelo mundo. O cenário internacional
aponta a tendência de crescimento da utilização da tecnologia. Hoje, ela já é
tratada como item obrigatório em
construções de diferentes portes.
Iniciativas governamentais de países nórdicos como
Finlândia, Noruega e Dinamarca, que lideraram a adoção da tecnologia em obras
públicas quando ainda não era tão popular, foram decisivas para que o BIM se
espalhasse e chegasse ao patamar atual. Os finlandeses usam a tecnologia desde 2001 para modelar obras, sendo que
em 2007 uma das estatais do país já obrigava o uso do BIM em seus projetos.
No mesmo ano, os noruegueses passaram a exigir a nova
ferramenta para projetos do governo ou com aporte significativo de recursos
públicos. E na Dinamarca também o uso do BIM se tornou obrigatório em empresas estatais e serviços públicos de
construção. Foi o pontapé inicial para uma onda mundial. Hoje há exemplos
bem-sucedidos da utilização de BIM em obras públicas no Japão, Estados Unidos,
Chile, Holanda e Cingapura, entre outros países. “O BIM começou a ser utilizado
especificamente na área de edificações, depois sua abrangência foi ampliada para incluir obras de infraestrutura. E
aí entra uma gama muito grande e variada, como estradas, pontes, túneis,
barragens, hidrelétricas, portos e aeroportos”, exemplifica Eduardo Toledo
Santos, professor da Universidade de São Paulo (USP).
Toledo destaca que, mesmo com a tendência internacional de
adoção do BIM, não há uma obra
considerada como marco da utilização da tecnologia quando se trata da área
de infraestrutura. “Os próprios padrões e conceitos ligados ao BIM para obras
de infraestrutura não estão consolidados”, explica. Ainda assim, a tecnologia
tornou-se imprescindível para modelar grandes construções. Projetar obras
complexas sem BIM é algo impensável
atualmente. “Sem dúvida o BIM é uma forte tendência internacional. Em todas
as obras maiores, que demandam um planejamento mais rigoroso, é um grande
auxílio. É muito usado também para intervenções,
como fazer um viaduto no meio da cidade, por exemplo. Isso tem impacto
paisagístico, no trânsito. Há softwares específicos para prever isso”, afirma
Toledo.
“Também é preciso destacar que o BIM tem papel importante
em obras menores e menos complexas,
porém repetitivas como no MCMV, UBS e lojas de varejo. Nesses casos, um estudo
detalhado apoiado pelo BIM, não só do projeto como também para um planejamento
minucioso e otimizado para a produção, permite obter economias significativas
nos empreendimentos”, acrescenta o professor.
Otimista, Toledo vê com bons olhos as iniciativas
brasileiras para acompanhar o cenário internacional e se juntar aos países nos
quais a tecnologia está amplamente disseminada. Cita exemplos de obras como as
de algumas estações do metrô de São Paulo, projetadas com BIM, para destacar
que, apesar de alguns passos atrás dos pioneiros nórdicos, o País trilha o caminho correto e quase
obrigatório da ampla adoção da nova tecnologia. “O Brasil vai ter de seguir
por aí. Estamos vendo esse movimento já com projetos-pilotos de utilização do
BIM, como o que temos no Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes
(DNIT) e na Secretaria de Aviação Civil, entre outros”, afirma.
Fiocruz
usa inovação para projetar sede de Minas Gerais
(Foto: Flick/CBIC/Reprodução)
Foi a partir de uma provocação em uma conversa informal que
a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) tirou
do papel seus planos de implementação de BIM que, até ali, eram embrionários.
Era 2014, e o projeto da nova sede da entidade em Minas
Gerais já estava previsto sem o uso da
tecnologia. Um dirigente da entidade, em um bate-papo com membros do
Departamento de Arquitetura e Engenharia da Fiocruz, colocou o pé no acelerador
da implementação das novas ferramentas. “Ele pediu para contratarmos em BIM.
Houve uma virada de chave muito importante ali. Já tínhamos pronto um termo de
referência de contratação do projeto, e não era em BIM. Tivemos que nos virar
para fazer uma adaptação. Não incluímos uma obrigatoriedade para as empresas
que participaram da licitação, mas colocamos o desenvolvimento em BIM como bônus que acrescentava uma pontuação no
momento da licitação”, explica a arquiteta Ana Paula Medeiros.
A escolha de acelerar o processo e projetar o novo prédio
com a tecnologia valeu a pena. As vantagens do BIM se mostraram na modelagem de
um empreendimento de alta complexidade. “Ter contratado em BIM tornou mais fácil o envolvimento de todos os intervenientes,
facilitou o modelo de comunicação e trouxe muitos benefícios para esse projeto.
É uma obra de grande complexidade, envolve laboratórios, biotérios, áreas para
coleções, todo um setor acadêmico e administrativo específico”, contou a
arquiteta Silvia Pereira.
Modelagem da sede mineira da Fiocruz. (Imagem: Estadão/Reprodução)
A iniciativa na Fiocruz, por seu ineditismo, também
enfrentou dificuldades no projeto. Os obstáculos trouxeram aprendizados que
foram incorporados para os próximos empreendimentos em que a entidade utilizará
o BIM. “Tivemos essas barreiras, como, por exemplo, saber como avaliar os modelos que recebemos. Ou entender como
estavam sendo extraídos os valores de quantidade de material necessário para a
obra. São questões complexas, ao mesmo tempo que a gente precisa capacitar a
equipe toda. Já fizemos algumas alterações em editais, incorporando lições
aprendidas”, afirma Pereira.
Mesmo que esse projeto inicial tenha sido marcado por
alguns entraves, a modelagem foi concluída. No momento, a nova sede de Minas
Gerais está em fase de obtenção dos licenciamentos, antes de obter o sinal
verde para a execução da obra. Enquanto aguardam a liberação para começar, as
arquitetas avaliam o processo com a certeza de que o caminho de adoção do BIM
não tem volta. Tanto que o uso da tecnologia foi incluído em um conjunto de premissas que a entidade segue para
todos os seus projetos, junto com flexibilidade e sustentabilidade, entre
outras.
Desde 2015, a
implementação de BIM na Fiocruz avançou de forma significativa, com uma série
de importantes ações: “Desenvolvemos um laboratório
de BIM e promovemos encontros com fornecedores, seminários, várias atividades
internas de capacitação mais ampliada. Hoje a gente depara com algumas questões
de como vamos conduzir esse trabalho daqui em diante. Nós somos uma área de
suporte, não de atividade-fim da Fiocruz, não somos um escritório de Engenharia.
Ainda assim, fica cada vez mais claro para nós que temos de coordenar e fiscalizar
esse desenvolvimento”, afirma Medeiros
Projeto
BIM Fórum Brasil é apresentado durante evento
(Foto: Flick/CBIC/Reprodução)
Uma das novidades do Seminário foi a apresentação do projeto BIM Fórum Brasil. O estudo
propõe a criação de um grupo que reunirá diferentes
atores envolvidos nos processos de implementação da tecnologia.
Os objetivos do novo órgão são coordenar ações de adoção,
minimizar a sobreposição de atividades para disseminação do BIM e atuar sobre lacunas
de difusão. A ideia surgiu a partir de diversos exemplos internacionais de
entidades semelhantes, que servem como um fórum independente, neutro e
representativo dos diferentes setores que trabalham com BIM. “Nós listamos pelo
menos 50 entidades correlatas, em mais
de 40 países. Oito delas têm inclusive o mesmo nome de BIM Fórum. A gente percebeu
que o Brasil estava um pouco atrasado nesse quesito”, destacou Eduardo Toledo,
professor da Universidade de São Paulo (USP) e um dos especialistas que
trabalharam no estudo encomendado pela CBIC.
A ideia do BIM Fórum Brasil é atuar alinhado à Estratégia Nacional de Disseminação do governo federal. Os associados serão pessoas jurídicas, que podem ser empresas públicas e privadas, órgãos da administração pública, instituições de capacitação de ensino e ONGs que compõem a cadeia produtiva da indústria da Construção Civil. Cada associado fará parte de um dos sete colegiados propostos. Esses colegiados elegerão seus representantes no Conselho Administrativo composto por 17 integrantes que definirá a estratégia e atuação do BIM Fórum Brasil. A composição, com assentos limitados para cada colegiado, visa dar equilíbrio entre os vários setores interessados em BIM de modo que nenhum deles tenha domínio sobre o Conselho.
O desafio agora é angariar
associados e, assim, enriquecer o diálogo sobre a tecnologia no País.
“Vamos harmonizar e focar os esforços para disseminação do BIM, captando mais recursos para seus avanços e
utilizando-os com eficiência”, concluiu Toledo.
Confira a transmissão online pelo Youtube:
Fonte: